Os grandes “objeto do desejo” da indústria automotiva sempre foram os esportivos com motorizações potentes e a mais moderna tecnologia a bordo. Mas pouca gente começa no universo automotivo dirigindo uma Ferrari, um Lamborghini ou um Porsche, privilégio reservado a um percentual ínfimo da população. Os “simples mortais” que não são milionários, logo que tiram sua carteira de motorista, normalmente optam por um carro básico, com um padrão aceitável de conforto e segurança. Algo sem maiores extravagâncias – até porque, para quem acabou de aprender a dirigir, é comum acontecer uma batidinha ou outra. Por isso, baixos custos de manutenção e reparabilidade ganham importância, assim como o câmbio manual – se um motorista não se acostuma a engatar manualmente as marchas logo que aprende a dirigir, dificilmente se adaptará mais tarde. Dentre esses carros que servem de “introdução ao consumo” dos automóveis está o Ka 1.0 SE, a versão mais barata do hatch compacto da Ford – exceto pela S, que não tem nem rádio e é destinada para frotistas.
A lista de itens de série é enxuta, mas precisa na função de atender às necessidades básicas de quem enfrenta o trânsito diariamente. Lá estão ar-condicionado, direção elétrica, vidros dianteiros e travas elétricas com controle remoto, chave tipo canivete, ajuste de altura da coluna de direção e rádio com Bluetooth e comandos de voz. Airbags frontais e ABS com EBD, como determina a legislação, também são de série. Itens mais “sofisticados”, como ajustes elétricos para os retrovisores externos ou uma central multimídia mais incrementada, não estão disponíveis na versão. Ou seja, apesar de não oferecer grandes requintes, o pequeno hatch da Ford entrega um “nível civilizado” em termos de conforto, segurança e conectividade. Em termos estéticos, o visual é o mesmo apresentado em 2014 e sutilmente remodelado no ano passado – as mudanças se resumiram à nova grade e aos novos para-choques. O fato de ser uma configuração de entrada não chega a ficar tão explícito, embora a ausência de faróis de neblina e a presença de rodas de aço de 14 polegadas cobertas com calotas evidenciem que não é um “top de linha”.
O Ka 1.0 SE é movido pelo propulsor tricilíndrico 1.0 de 85 cavalos de potência e 10,7 kgfm de torque com etanol. Na aferição de consumo promovida pelo Inmetro, o conjunto obteve médias de 9,2 km/l na cidade e 10,7 km/l na estrada com etanol e 13,4 km/l na cidade e 15,5 km/l com gasolina, que lhe renderam um conceito “A” na comparação relativa da categoria e o Selo Conpet de Eficiência Energética Veicular. Para obter esse selo, um automóvel precisa ser eficiente energeticamente, não só comparado a modelos semelhantes da sua categoria (classificação relativa), como também comparando a todos os demais modelos participantes do Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular (PBEV).
Segundo a tabela da Ford, o Ka 1.0 SE custa R$ 46.490. Porém, o modelo é “figurinha fácil” nas “Ofertas Ford”. No final de fevereiro, era oferecido no site da marca por preços a partir de R$ 42.490 à vista ou entrada de R$ 32.717 e saldo em 18 vezes de R$ 600. Na prática, por um valor similar aos concorrentes, essa versão do compacto fabricado na cidade baiana de Camaçari cumpre a proposta de oferecer o que se espera encontrar em um hatch básico, com os níveis aceitáveis de conforto, segurança e tecnologia dos quais ninguém gosta de abrir mão. E a versão mais barata tem ajudado a embalar as vendas do Ka. Desde o lançamento de sua linha 2019, em julho do ano passado, o compacto da Ford ganhou volume de emplacamentos e passou a ameaçar o Hyundai HB20 na briga pela vice-liderança nacional de vendas – ambos ficam atrás do líder Chevrolet Onix. Este ano, o Ka ultrapassou o HB20 e emplacou 15.656 unidades em janeiro e fevereiro, ocupando o segundo lugar no ranking nacional de vendas de automóveis no primeiro bimestre de 2019.
Experiência a bordo
Simples assim
O Ka oferece acesso fácil, com bons ângulos de abertura de portas. Há espaços bem projetados para abrigar objetos no interior, além dos específicos para levar copos ou garrafas. O espaço interno dá para quatro passageiros sem grandes apertos. Os plásticos dominam o habitáculo, entretanto, a montagem é precisa. É simples, não faz feio. O isolamento acústico não é dos melhores e o barulho do propulsor entra na cabine com vontade quando o motorista acelera um pouco mais. Todavia, nada muito diferente do padrão dos haches compactos.
O painel do Ka SE não tem maiores requintes, porém é bem resolvido. Acima do sistema de som fica um porta-objetos cuja tampa também serve para prender um telefone celular. Dentro do compartimento, fica uma entrada USB, o que é prático para carregar o smartphone enquanto se usa o GPS no trânsito. O sistema de som traz Bluetooth, mas o volante não é multifuncional e os comandos são todos junto à tela. Os vidros elétricos só estão disponíveis na frente, os de trás são manuais, com as nada saudosas manivelas que dão um toque quase “vintage”. Os ajustes dos retrovisores são manuais, contudo não é necessário meter os dedos no espelho – comandos satélites ajudam a escolher a posição ideal de cada retrovisor. Apesar de mais simplificado que o tradicional Sync com tela sensível ao toque, o computador de bordo cumpre a função de dar informações relevantes sobre consumo e autonomia. O porta-malas leva apenas 257 litros, volume um pouco abaixo da média do segmento.
Primeiras impressões
Eficiência sem extravagâncias
O motor 1.0 de três cilindros e 85 cavalos da Ford é moderno e empurra o pequeno Ka com facilidade. Arrancadas são boas e, a partir dos 3 mil giros, o “powertrain” fica à vontade. O torque máximo aparece em 3.500 rpm com gasolina, mas só em 4.500 mil giros com etanol. Contudo nada disso representa qualquer problema para a performance. Ultrapassagens e retomadas podem ser feitas de forma precisa, em um bom padrão dinâmico em relação ao segmento de hatches 1.0. O Ka sempre teve engates suaves e o novo câmbio lançado com a linha 2019 honra essa tradição. O entendimento do motor com o câmbio manual de 5 velocidades é amistoso e a transmissão oferece engates precisos, rentabilizando bem o desempenho do conjunto. A assistência elétrica da direção foi recalibrada e ficou mais direta.
Embora não ofereça “luxos” como um controle eletrônico de estabilidade, tecnologia que é sempre bem-vinda e efetiva em termos de segurança, o Ka tem uma suspensão bem resolvida, é naturalmente bem equilibrado e evolui com firmeza nos caminhos sinuosos, sem vacilações. As rolagens de carroceria, que só ocorrem em velocidade elevadas, são discretas e a suspensão absorve com eficiência as irregularidades lamentavelmente habituais nas ruas brasileiras. São as vantagens de um modelo que já frequenta o mercado nacional há algum tempo e já está acostumado aos “pedaços de mau caminho” das vias locais. Para quem se incomodar com o estilo “espartano” do Ka 1.0 SE, vale dar uma espiada na versão SE Plus, que acrescenta Sync com tela touch, retrovisores elétricos, vidros elétricos nas quatro portas e sensor de estacionamento traseiro. Anda sendo oferecida por menos de R$ 3 mil acima da SE.