Em meio à redução generalizada das vendas automotivas causada pela pandemia da Covid-19, as picapes estão fazendo bonito. Impulsionados pela boa fase do agronegócio de exportação – que aumentou sua lucratividade com a brutal elevação da cotação do dólar –, os utilitários com caçamba foram o segmento automotivo menos impactado do Brasil nos meses de março, abril e maio. Um dos modelos que melhor aproveitaram essa tendência é a Ranger. Com as 1.400 unidades vendidas em maio, a picape média da Ford atingiu a sua maior participação da história, de 24,2%. De quebra, superou as vendas da Chevrolet S10 – que teve 1.267 emplacamentos no mês passado – e assumiu a vice-liderança do segmento, com uma diferença de apenas quarenta e quatro unidades em relação à líder Toyota Hilux. No ranking geral dos automóveis mais vendidos da indústria brasileira, o modelo da Ford ocupou em maio uma inédita décima terceira posição. Dentro da linha Ranger, a nova versão Storm, apresentada em abril – ou seja, em plena pandemia –, sintetiza bem as características mais valorizadas pelo consumidor da picape da Ford: motor a diesel de alta potência e torque, chassi em longarina e tração 4×4. Tudo isso com o singular estilo “duro na queda” inerente à configuração Storm, utilizada há tempos na picape F-150 – o veículo mais vendido nos Estados Unidos.
A versão Storm – o termo em inglês significa tempestade – apareceu inicialmente como conceito no Salão do Automóvel de São Paulo de 2018. Em virtude da boa aceitação, foi desenvolvido especialmente para o mercado brasileiro, com produção na fábrica argentina de Pacheco, de onde vêm todas as outras Ranger. Com tração 4×4 com reduzida e diferencial traseiro blocante, a Storm se deriva da versão intermediária XLS 4×4 automática, mas traz sob o capô o motor Duratorq turbodiesel 3.2 de cinco cilindros, o mais forte da linha, que rende 200 cavalos de potência e 47,9 kgfm de torque. Já a configuração XLS vem com o propulsor 2.2 turbodiesel de quatro cilindros, com 160 cavalos e 39,3 kgfm. No Programa Brasileiro de Etiquetagem do Inmetro, a Ranger Storm 3.2 4×4 automática recebeu a pouco edificante nota D, tanto do geral quanto no segmento, com um consumo de 8,4 km/l na cidade e 9,4 km/l na estrada. Além do motor mais “parrudo” da linha, a Storm “pegou emprestada” a suspensão mais robusta usada nas versões XLT e Limited.
Esteticamente, a característica mais evidente da versão aparece na grade, tomada por seis letras garrafais em preto fosco que formam a palavra “storm”. Detalhes no mesmo tom “dark” substituem todos os cromados da carroceria e se espalham pelas carenagens dos espelhos, maçanetas, para-choque traseiro, estribos laterais e molduras das caixas de roda. Também em negro, o santoantônio “herdado” da Ranger FX4 norte-americana tem base estendida até a parte traseira e é fixado em pontos estruturais da caçamba. Os faróis trazem máscara negra, as lanternas têm capa fumê e faixas decorativas aparecem no capô e nas portas. No entanto, é nas rodas aro 17, também pintadas de preto fosco, que se encontra um dos maiores charmes da versão – os pneus Pirelli Scorpion AT Plus 265/65 R17, desenvolvidos especificamente para a Ranger. O pneu teve os ombros reforçados para aguentar o tranco no fora-de-estrada e para ganhar uma banda de rodagem com gomos autolimpantes.
Por dentro, o acabamento dos bancos da Ranger Storm é em tecido preto e todos os plásticos são em negro. O sistema multimídia é o Sync 3 com tela de 8 polegadas, que traz os aplicativos Android Auto e Apple CarPlay conectados via cabo. A picape traz ar-condicionado automático duplo, controle de cruzeiro e volante multifuncional. O banco do motorista tem ajuste de altura, apoio lombar e apoio de braço. Em termos de segurança, os destaques são os sete airbags – frontais, laterais, de cortina e de joelhos –, controle de estabilidade e tração, controle automático de descida, sistema anticapotamento e controle adaptativo de carga.
A Storm tem preço sugerido de R$ 161.690, na cor sólida Vermelho Bari do modelo avaliado. A também sólida Branco Ártico acrescenta R$ 800 e as cores Cinza Moscou (perolizada), Prata Geada (metálica), Preto Gales (perolizada), Vermelho Toscana (perolizada) ou Azul Belize (perolizada) aumentam a fatura em R$ 1.750. Está longe de ser um veículo barato, porém, o preço é bem competitivo, não apenas em relação à concorrência – modelos com equipamento similar são mais caros –, como também em relação ao restante da linha Ranger. A Storm custa R$ 4 mil a menos que a versão XLS 4×4 com motor 2.2 de 160 cavalos automática. Ou ainda R$ 34 mil a menos que a XLT e R$ 44 mil abaixo da “top” Limited, ambas com o mesmo “powertrain” da Storm. A relação custo/benefício certamente transformou a Storm em uma “puxadora de vendas” da Ranger – entretanto, a Ford considera tal informação estratégica e não divulga o “share” de suas versões.
Experiência a bordo
Belo espécime
A Ranger é um veículo alto e um tanto difícil de se acessar, apesar do estribo lateral e das alças nas colunas dianteiras. Por dentro, tem dimensões generosas e bancos confortáveis. Os revestimentos, todos em preto na versão Storm, conferem um bom aspecto ao habitáculo. Há muito plástico rígido, como é típico das picapes médias, e o estilo geral segue a tendência mais rústica, que valoriza a facilidade de uso. Não há fartura de porta-trecos na cabine, mas os que existem são funcionais.
A versão Storm traz uma configuração simplificada do tradicional multimídia Sync 3 com tela de 8 polegadas, sem GPS interno – exibe somente uma bússola. Os aplicativos Android Auto e Apple CarPlay funcionam por cabo e o Bluetooth é de fácil conexão. O volante multifuncional tem comandos simples e as duas telas de LCD de 4 polegadas, uma de cada lado do velocímetro, possibilitam navegar pelas diferentes funções.
Impressões ao dirigir
Questão de ambiente
Nas ruas congestionadas das grandes cidades ou nos estacionamentos compactos dos shopping centers, a Ranger Storm parece um tanto deslocada. Seu jeito abrutalhado intimida os motoristas dos veículos em torno dela, que tendem a abrir espaço e manter uma distância prudente. No entanto, ao contrário do que possa parecer, trata-se de um veículo dócil. A providencial câmera de ré e os sensores ajudam a dimensionar a volumosa traseira nas manobras de estacionamento. Já nas estradas, embora o motor turbodiesel de 200 cavalos de potência e 47,9 kgfm de torque não seja tão elástico, o câmbio automático é eficiente na tarefa de manter as mais de duas toneladas de picape se movendo de forma “esperta” o tempo todo. As marchas são um tanto curtas, todavia, é possível de se recorrer às trocas manuais, feitas diretamente na alavanca. Na cidade ou na estrada, a Storm honra as boas tradições da Ranger e combina um bom nível de conforto com um comportamento dinâmico vigoroso.
Seja nas ruas ou nas pistas, o asfalto definitivamente não é o “habitat” da Storm. A versão vem com o mesmo ajuste de suspensão dos modelos XLT e Limited, mas traz rodas mais estreitas (aro 17) e pneus Pirelli Scorpion AT Plus, mais altos e com calibragem menor que os 265/60 R18 que “calçam” as versões mais caras da Ranger. Nos pisos lisos e regulares, a diferença nos pneus aumenta a rolagem lateral da carroceria da Storm nas curvas rápidas e reduz um pouco a “sutileza” do rodar característico da Ranger. Contudo, permite à versão melhores performances em pisos maltratados e no off-road. Na hora de encarar lama e buracos de verdade, uma arquitetura com chassi em longarina como a da Ranger mostra o seu valor. As habilidades para superar os obstáculos se expressam em números – ângulos de ataque e de saída de 28 graus e de 26 graus, altura livre para o solo de 23,2 centímetros e capacidade de submersão de 80 centímetros. E a Storm também traz protetores de cárter e de tanque de combustível. Com o motor turbodiesel 3.2 litros que entrega todos os 47,9 kgfm já em 1.750 giros e os atributos como 4×4, reduzida e bloqueio de diferencial, basta saber usar os recursos – e também a prudência – para transpor sem sustos as crateras e os lamaçais.
Ficha técnica
Ford Ranger Storm
Motor: a diesel, dianteiro, longitudinal, 3.198 cm³, cinco cilindros em linha, turbo, quatro válvulas por cilindro e sistema de abertura variável de válvulas. Injeção direta e acelerador eletrônico
Transmissão: automática com 6 marchas à frente e uma a ré. Tração integral com reduzida. Oferece controle de tração e bloqueio eletrônico do diferencial traseiro
Potência máxima: 200 cavalos a 3 mil rpm
Torque máximo: 47,9 kgfm de 1.750 a 2.500 rpm
Suspensão: dianteira independente com molas helicoidais e amortecedores a gás. Traseira com eixo rígido, feixes de molas e amortecedores a gás. Barras estabilizadoras na frente e atrás. Oferece controle eletrônico de estabilidade
Pneus: 265/65 R17 Pirelli Scorpion AT Plus
Freios: discos ventilados na frente e tambores atrás. ABS e EBD.
Carroceria: picape com carroceria sobre chassi, com quatro portas e cinco lugares. Com 5,35 metros de comprimento, 1,86 metro de largura, 1,82 metro de altura e 3,22 metros de distância de entre-eixos
Peso: 2.230 kg
Capacidade da caçamba: 1.180 litros
Tanque de combustível: 80 litros
Produção: General Pacheco, Argentina
Preço: R$ 161.690, na cor sólida Vermelho Bari do modelo avaliado
Por: Luiz Humberto Monteiro Pereira/AutoMotrix – Fotos: Luiza Kreitlon/AutoMotrix
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